sábado, 5 de outubro de 2013

-- Calle 13 LatinoAmerica e o conceito de America Latina.

pensar na construção do termo “latino-americano”. O conceito foi criado em 1836 na França, no intuito de reforçar e reafirmar o imperialismo francês sobre os países de língua espanhola, assim como fazer frente ao avanço imperialista dos Estados Unidos sob os mesmos países. Já o conceito de “Pan-americanismo” surge tempo depois nos EUA, aproximadamente um mês antes da Conferência Internacional Americana de 1889, onde houve a substituição do nome para “Conferencia Pan-Americana”. Na tentativa é claro, de fazer frente à dominação ideológica dos franceses sobre os povos da America hispânica; sem nos esquecer que depois da independência dos EUA cresce de modo constante a busca por anexos de novos territórios ao país, como foi o caso do México. É justamente nesse processo que os países da então denominada America Latina, se apropriam do termo e atribui-lhe outro significado, construído de modo a afirmar o que realmente seria essa identidade comum ao qual querem reconhecimento, tornando mais valido e forte para se posicionar frente aos Estados Unidos e à França, já que os países completamente separados ficavam vulneráveis às intervenções exteriores.
            O texto de Alain Rouquié “O Extremo-Ocidente: Introdução à America Latina” nos faz pensar em primeiro plano o discurso de alteridade e o caráter etnocêntrico adotado para descrever/adjetivar e mesmo classificar, os países da America central e sul, dentro de uma dinâmica completamente heterogênea e desconhecedora das reais singularidades que distingue os países entre si, tendo em vista que tiveram processos e agentes históricos diferentes, que prescreveram rumos diferentes no desenvolver social, político, econômico e cultural. No prefacio do texto, ao se referir aos povos já existentes na America antes das chegadas dos europeus, usa o termo “civilização” entre aspas. Mas porque? Notamos então, que já de começo o autor parte de um molde civilizatório segregacionista e etnocêntrico, seguindo os moldes europeus. Citando Lucien Febvre, usa o termo “laboratório latino-americano” como um adjetivo para os países que aí estão inseridos (apenas pela ótica eurocêntrica), demonstrando supremacia ante os mesmos.
O conceito de America Latina trabalhada por Alain Rouquié segue na dinâmica de um instrumento de delimitação preciso, mas bastante confuso. Confuso porque gera uma grande problemática: Quais países entram na demarcação da América Latina? E preciso porque parte da bifurcação (no grande geral) entre países desenvolvidos e subdesenvolvidos. Assim eles são classificados a partir do nível de seu desenvolvimento industrial e econômico, assim como pela idioma, território. Um fato que realmente somos obrigados a concordar com Rouquié é que um desses elementos de comunhão com grande maioria desses países seria um fator cultural voltado para a mestiçagem, não só se tratando de cor, mas também dentro de uma dinâmica cultural mestiça. O termo “latino América” deligencia de uma maneira etnocêntrica englobar todos os países que, segundo o autor, se identificam pela questão da mestiçagem e principalmente pelo subdesenvolvimento industrial (atrasado) para poder fazer referencias. Tendo em vista que o objetivo do termo era criar uma consciência de unidade, a falta de preocupação com as especificidades de cada um, ou seja, a generalização, não favorece nenhum surgimento que se remeta a algo dessa instancia.
Devemos pensar a construção de uma identidade subcontinental “comum” e forte, para justificar o emprego do conceito de America Latina, usado para classificar os países da America do sul e central, assim como o México. Por conseguinte essa classificação faz sobressair a zona política em relação à zona geográfica. Comuns alem de tudo, porque todos esses, de acordo com Rouquié, foram dependentes do mercado mundial como produtores de matéria prima e bens alimentares – ponto de vista completamente reducionista e que reproduz o imaginario de “dominador” que esses países possuem, ate os dias atuais inclusive. Esse movimento descarta a diversidade e peculiaridades dessas nações. Somos países tão disparos em tantos pontos, tanto em economia, quanto territorial, língua, relações sociais e culturais. O conceito de latino-america tenta, por via de um discurso de alteridade etnocêntrico, abraçar esses países, propagando um sentimento de unidade por via desses termos.  Sendo assim, os latinos americanos seriam todos os países em vias de desenvolvimento e não dependem simplesmente da historia, encontrando-se igualmente em estruturas análogas e com problemas idênticos. Conceito que foge totalmente do preocupar com as especificidades de cada pais e, a forma como ele usa o adjetivo idêntico, nos da idéia do generalizar, justamente porque ele é um Francês e não um latino Americano, caso contrario teria a mínima noção de que nossos problemas não são nem um pouco “idênticos”. Para Rouquié, esses países possuem em comum a miséria, a desgraça; cultivam a cultura da pobreza.
Os latinoamericanos por sua vez, apresentaram uma resposta diante a essa disputa entre França e EUA. De acordo com Arturo Ardão no texto “Panamericanismo e Latinoamericanismo” explica por outras vias de interpretação as conseqüências que esses conceitos provocaram dentro do conjunto de países disputados. A título de começo, o autor nos insere dentro de um contexto histórico bem mais amplo que Rouquié, tendo em vista que nos da dimensão de criação (e seus reflexos) dos dois termos. Identifica também o processo de imposição de ideologias tanto da frança, quanto dos EUA, com sua “Doutrina Monroe”.
Dentro desse processo de construção do termo de America Latina, surge o latinoamericanismo, que circula aqui devido ao intercambio de intelectuais hispanoamericanos que estavam na França. O conceito, por sua vez, também recebeu outra apropriação, mas dessa vez partindo dos próprios “latinoamericanos” para fazer frente tanto aos EUA, quanto à França. Essa nova imagem seria a imagem que condecora seu próprio espaço, de modo a reconhecer suas diferenças e especificidades, ainda que o referente mestiçagem seja bastante evocado por fazer realmente parte do contexto social que se inserem. O processo de definição e aplicação do conceito de America Latina desaparece como contradição interna e ganha espaço nas discussões exteriores.  Nestes termos, os próprios latinoamericanos criam a imagem comum de um conjunto de países que, apesar de terem sido explorados ao seu máximo, de terem tido sua população nativa dizimada, de terem que “aceitar” um padrão sociocultural europeu, reconhecem o processo histórico pelo qual foram submetidos de forma totalitária e injusta, distanciando o emprego da  imagem de vitimizados. Isso porque os significados dessa expressão nos fazem inferências a algo que é menos que o outro e que por sua vez, mantém dependências históricas e dependências presentes (tanto econômicas quanto culturais); Imagem contraria à que os próprios latinoamericanos querem fazer reconhecida.
            A musica “Latinoamérica” da banda porto-riquenha Calle 13, nos apresenta exatamente este contexto, tanto em seus versos quanto na difusão semiótica das imagens do clipe. A começar pelo primeiro verso da musica: “Soy, soy lo que dejaron... Soy toda la sombra de lo que robaron” que segue de modo concomitante com a imagem de um coração batendo. Esses elementos nos fazem referencia a justamente a esse contexto de apropriação de um novo signo ao conceito de America Latina, construído pelos próprios latinoamericanos. Sendo assim, eles se afirmam exatamente diante dessa disputa entre EUA e França, de modo que tenham reconhecimento mundial; justamente por isso se faz uso do verbo sou como mecanismo de afirmação, denotando um posicionamento consciente dessas nações do que realmente elas são, das verdadeiras características que as ligam. “Sou aquilo que restou do que roubaram”,  verso que se liga as antigas civilizações  já existiam muito antes da chegada dos europeus e que, quando chegaram, “roubaram” a verdadeira identidade do que eram por via enfática da difusão de seus padrões culturais, sociais, políticos e afins  de maneira violenta e que visava apenas a exploração dos recursos naturais e mão de obra que as “novas” terras ofereciam. Para tentar representar o que seria essa nova imagem construída pelos latinoamericanos, farei uma seqüência de analise de alguns versos que nos ilustram isso.
Eu sou o sol que nasce e o dia que morre
Com os melhores entardeceres
As mais belas paisagens se encontram no nosso território latinoamericano.
“Sou o desenvolvimento em carne viva
Um discurso político sem saliva”
Esse verso, por sua vez, esta exatamente contradizendo a idéia de Rouquié a despeito das classificações pautadas na classificação de desenvolvimento e subdesenvolvimento.
“As mais belas faces que conheci
Sou a fotografia de um desaparecido”
Nos relembrando a discussão historiográfica de que a América não tem história. Visto que a fotografia faz alusão a um passado congelado e recortado daquilo que não existe mais.
O sangue em suas veias
Sou um pedaço de terra que vale a pena
Uma cesta com feijão, eu sou Maradona contra a Inglaterra
Anotando-te dois gols”

“Sou o que sustenta minha bandeira
A espinha dorsal do planeta, é a minha cordilheira”
Já estes versos são de extrema importância pro que ressaltam a total consciência de que eles foram e são e serão a “espinha dorsal” do planeta, ou seja, aquele que dá sustentabilidade aos demais países. Versos importantes que demonstram uma apropriação oposta àquela francesa.

De acordo com Ardão, os anos de 1948 simbolizam um marco histórico de extrema importância para reconhecimento, em dimensão mundial, do novo signo que o termo latinoamerica construíra, devoto de uma construção própria do latinoamericanismo (aos moldes latinos simbolizado pela criação da CEPAL, etc). Já o conceito de panamericanismo foi cada vez mais entrando em desuso, causado pelo pensamento critico da America Latina, (contradizendo os dizeres de Rouquié no que diz respeito à sua afirmação sobre a falta de alcance de discussões em torno das reformas de base – vamos chamar assim- ao âmbito político e teórico, social e cultural; o que não é verdade). Hoje, em decorrência desse fato, se usa a reconfiguração do termo “inter-panamericanismo”.  (texto incompleto)

Nenhum comentário:

Postar um comentário