UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO
ICHS
– Mariana
Nome: Fernanda Gabriella Silva Ribeiro
Data: 14/12/2011 Disciplina: História da Escravidão
Prof.: Andréa Lisly Atividade Avaliativa (trabalho)
Como forma de
organizar os escravos trazidos da áfrica, Mariza de Carvalho Soares em seu
texto “Mina, Angola e Guiné: nomes d’África no Rio de Janeiro setecentista” aponta
como fator principal a origem do escravo que acompanhava os seus nomes; critério
pelo qual eram encaixados na sociedade. De acordo com Soares o nome traz a
marca de designação de um grupo: suas características físicas e
comportamentais, línguas, crenças e formas de vestir.
Soares critica a corrente
historiográfica que, mesmo abordando temas como escravidão e o trafico, se
esquecem da composição étnica da escravaria, visto que “mesmo quando recobrem universos empíricos idênticos, elas correspondem
a indagações teóricas de diferentes ordens”.
Neste texto Mariza de Carvalho
Soares vai se debruçar sobre a noção de identidade étnica desses escravos
trazidos da África, tendo como fonte os livros de batismo de escravos relativos
aos anos de 1718 a
1760. Nesta análise, a autora percebe que havia a necessidade de se registrar a
procedência e a cor dos escravos. Parte do ano de 1718 porque nesta data foi
aberto na freguesia da Sé – Rio de Janeiro- o sétimo livro dos “pretos cativos”
para registro de cativos, e nota que ao ganharem a alforria, não bastava apenas
ganhar a liberdade. Seus nomes deveriam sair do “livro dos pretos” para o
“livro dos brancos”. Soares observa também que a porcentagem de adultos
batizados corresponde em maior numero (77,55%) de escravos minas. Esse elevado
número se deve também a não realização de batismos nos portos de embarque da
Costa Mina; enquanto que os vindos de Angola, eram batizados em São Paulo de Luanda.
Portanto, como esse registro era feito apenas uma vez, o numero de angolanos na
cidade do Rio de Janeiro registrados era menor do que os vindo de Mina.
Esses escravos traziam junto ao nome a indicação do “gentio” ou “nação” a
que pertencem, mostrando a convivência de dois sistemas de classificação e
organização da escravaria africana. Diferenciando os dois termos, Soares diz
que a palavra gentio está associada àqueles que seguem a chamada lei natural,
diferente dos cristãos e judeus, e era usada para designar os povos almejados
pela catequese missionária, enquanto que a palavra nação diz respeito á um país
ou região que possuem leis, línguas e governos a parte e se aplicava a cristãos
ou infiéis, com o qual o Estado português se relacionava. Diferencia os termos
também pelo período de tempo em que foram usados. ‘Nação’ foi usado durante
todo o tempo, desde o século XV ao século XIX, enquanto que ‘gentio’ cai em
desuso no século XVIII. Apesar disso, os escravos vindos de Guiné eram sempre
classificados como gentio.
Essas distinções eram necessárias, pois havia uma diferença de tratamento
dos escravos de acordo com sua procedência. Soares chega a essa conclusão
embasada nas anotações do vigário Ignácio Manoel, as quais essas diferenças de
tratamento são relatadas.
Soares faz menção, e se contrapõe, ao antropólogo Herskovits, que baliza
os estudos sobre os negros no Brasil, utilizando um artifício que o permitiu
comparar as características culturais de um grupo de escravos do Novo Mundo com
grupos étnicos africanos. Dessa maneira, Herskovits traça pontos em comum entre
as culturas africanas e suas perpetuações no Novo Mundo. Mariza Soares se
diverge desse pensamento herskovitiano, porque segundo ela “partem do pressuposto de que um grupo étnico se define em função de
traços culturais que podem ser subtraídos, acrescidos ou transferidos,
reaparecendo do outro lado do Atlântico sob forma de ‘sobrevivências’ ou ‘resistências’
da cultura africana’[1]’
e que essa perspectiva “se não
desconsidera, pelo menos minimiza a importância das transformações porque
passam segmentos de grupos étnicos transferidos de forma tão violenta de um
continente para o outro.” [2]
Soares aponta que essas culturas são distintas, e que mesmo se os
escravos tivessem optado pela reconstrução da cultura africana no Novo Mundo,
sua cultura não seria a mesma. Para tal conclusão, soares ressalta a definição
de cultura por ela utilizada. Tal conceito distancia-se da idéia de busca por
traços originais e de resistência à mudança. Para ela, a cultura é algo mutável
de acordo com o lugar em que se encontra. Ou seja, um grupo de procedência
denominado “mina” no Rio de Janeiro pode ser diferente daquele designado como
“mina” na Bahia ou em outras regiões do Brasil assim com na África. Segundo a
autora esses grupos de procedência se constituem das relações entre escravos e
as sociedades escravistas; e se de um lado esses grupos são tidos pelos livros
paroquiais como uma forma de identificação e organização dos escravos, por
outro lado os próprios escravos faziam uso dessa classificação como meio de se
organizarem.
Nesse contexto, Marisa Soares exemplifica sua analise através dos
registros de casamento de escravas, visto que acredita que estes são exemplares
para análise da organização dos grupos de procedência na cidade do Rio de
Janeiro. Os casamentos entre escravos eram favorecidos e vários senhores tinham
o costume de casar seus escravos entre si. Mesmo que Soares não mencione isso
em seu texto, o casamento é importante porque permite ao escravo constituir uma
família, mantendo assim suas tradições e costumes, mesmo que essas tenham
sofrido transformações; assim, se formavam laços de solidariedade horizontais entre
os escravos, possibilitando assim a passagem de suas crenças a seus
descendentes. Para os senhores, o casamento também era uma forma de recompensa
pelo bom comportamento, sendo assim, este artifício, por mais que possibilite
laços horizontais de solidariedade entre os escravos, impede de certa forma que
eles se revoltassem contra seus senhores.
Marisa Soares diz que esses casamentos, forçados ou não, entre escravos
de um mesmo grupo de procedência, podem ser explicados no plano de conveniência
dos senhores. Mas, como o numero de casamentos era relativamente alto entre
esses escravos de mesma procedência, a autora acredita que havia outros tipos
de motivações e regras para acontecerem; fatores que vão para alem da
disposição de seus senhores em casar suas escravas, mas que segundo Soares,
essas fontes não revelam. Os dados sobre os casamentos de africanos na Bahia e
no Rio de Janeiro mostram como as estratégias para a constituição dos grupos de
procedência podiam variar.
Soares ressalta para o esclarecimento do conceito de identidade étnica e
os mecanismos utilizados para sua identificação. O conceito está diretamente
relacionado com o próprio conceito de cultura. Portanto, “tanto a cultura quanto a identidade étnica de um grupo estão em
estreita ligação com as condições de vida da sociedade na qual estão inseridos.”
[3]
A autora conclui que a identificação de um grupo étnico, num conjunto de
escravaria, é possível pelas formas culturais e/ou interesses envolvidos na
organização de um grupo. A identidade dos escravos é construída por via da
combinação do grupo étnico a um grupo de procedência, sendo que podem ser
atualizados de acordo com a ocasião. Segundo Marisa Soares, essa convivência
entre grupos distintos de procedência ou iguais ajudam a formar uma identidade
comum entre esses grupos, construída nas novas condições de cativeiro.
“Por
fim, a possibilidade de recursos a múltiplos critérios para constituições de
grupos (entre eles o grupo étnico e a procedência) termina por viabilizar a
constituição de grupos que reivindicam até mesmo uma nova identidade
“inventada” com base em formas culturais partilhadas pelo grupo naquele dado
momento, independente da sua vida pretérita. As chamadas ‘nações’ de candomblé
são um exemplo de tradições inventadas.” [4]
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
SOARES, Marisa de Carvalho – “Mina, Angola e Guiné: nomes d’África
no Rio de Janeiro setecentista” .
[1]Marisa de
Carvalho Soares - “Mina, Angola e Guiné:
nomes d’África no Rio de Janeiro setecentista” p.86
[2] Idem 1
[3] Marisa
de Carvalho Soares - “Mina, Angola e
Guiné: nomes d’África no Rio de Janeiro setecentista” p.91
[4] Marisa
de Carvalho Soares - “Mina, Angola e
Guiné: nomes d’África no Rio de Janeiro setecentista” p.92
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