O
livro de Terry Eagleton que utilizei foi ‘As ilusões do pós-modernismo – a lógica
cultural do capitalismo tardio’. Neste livro, Eagleton começa apresentando a
diferença entre termos pós-modernidade,
que alude a um período histórico especifico e o termo pós-modernismo, que se refere à forma de cultura contemporânea. Apesar
dessa distinção, autor opta por abranger o termo pós-modernismo para definir as duas coisas; sendo assim, irei me
referir ao termo segundo o entendimento de Eagleton. O autor definiu o
pós-modernismo como
“um estilo de cultura que reflete um pouco essa
mudança memorável por meio de arte superficial, descentrada, infundada, auto
reflexiva, divertida, eclética e pluralista, que obscurece as fronteiras entre
a cultura ‘elitista’ e a cultura ‘popular’, bem como entre a arte e a experiência
cotidiana.”
Sua analise tende a fazer um exame
negativo do pós-modernismo apesar de, em alguns momentos, apontar algumas
instancias positivas. Eagleton denomina o pós-modernismo como um fenômeno hibrido.
Fixei-me um pouco nesta expressão, pois achei muito digna de analise. O
significado da palavra hibridez no dicionário, faz referencia à uma anomalia,
irregularidade. Nos termos biológicos o ser hibrido designa um cruzamento genético
entre duas espécies distintas, que geralmente não podem gerar descendentes. Assim
sendo, o pós-modernismo é encarado como um fenômeno anômalo e irregular, esquizofrênico
e incapaz de se reproduzir. Para ele, o fenômeno parte de uma ‘desconstrução’,
onde todos são vitimas da própria logica capitalista[i] -
pelo menos no âmbito da produção cultural – o que acaba por ocultar a ideia de
sistema criativo, que Fredric Jameson tanto apresenta como característica da
pos-modernidade e do pós-modernismo.
Nesse contexto, Fredric Jameson em seu
livro “Pós-modernismo – a logica cultural do capitalismo tardio”, acredita que “é mais seguro entender o conceito do pós-moderno
como uma tentativa de pensar historicamente o presente em uma época que já se
esqueceu como pensar dessa maneira”. Jameson chega a essa conclusão porque
enxerga que a consciência pós-moderna consiste na enumeração de mudanças e modificações;
o pós-moderno busca as rupturas em tudo aquilo que já foi. No lugar da busca
pelo novo, pelos novos mundos (como reflete o pensamento modernista), o pós-modernismo
busca o instante revelador, um ‘quando tudo mudou’ e ‘como ele mudou’. Já os
modernos se preocupam no que acontecerá após a mudança. Jameson reflete:
“O pós-modernismo
é o que se tem quando o processo de modernização esta completo e a natureza já se
foi para sempre. É um mundo mais completamente humano do que o anterior, mas um
mundo no qual a cultura se tornou uma verdadeira ‘segunda natureza’’’. P.13
O pós-modernismo é um conceito muito
complicado para ser definido porque estamos vivenciando exatamente este período;
apesar disso, podemos falar, ainda que de modo confuso, de suas propriedades
reveladoras e de suas características mais comuns por fazermos parte disto tudo.
Damos nome àquilo que estamos vivendo. Por isso, falar sobre este fenômeno, ou
este momento histórico, é necessário que haja uma sensibilidade diante dessa
mudança histórica que está ocorrendo, seja pela via direta socialista como de
Terry Eagleton, seja pela logica cultural do capitalismo, como Fredric Jameson.
Não obstante, Jameson denomina o pós-modernismo
como um novo gênero discursivo, tendo em vista que uma das características mais
marcantes do pos-moderno é o modo pelo qual, nesse período, inúmeras analises
de tendências – como por exemplo os estudos sobre marketing, criticas de
cultura, novas terapias, amostras de cinemas e etc. – se aglutinam formando
este novo gênero discursivo; tudo isso é terminologicamente chamado de “teoria
do pós-modernismo” pelo autor.
“A teoria do pós-modernismo
é o esforço de medir a temperatura de uma época sem os instrumentos e em uma situação
em que nem mesmo estamos certos de que ainda existe algo com coerência de uma ‘época’,
ou ‘zeitgeist’, ou ‘sistema’ ou ‘situação corrente’. A teoria do pós-modernismo
é, então, dialética, pelo menos na medida em que tem a sociedade de usar essa
incerteza como sua primeira pista e agarra-se a esse fio de Ariadne em seu
caminho através de algo que talvez não se revele, no fim das contas, um labirinto,
um aglutinamento ou talvez um shopping center”. P15.
A
arte pos-modernista rompe com os precedentes da arte modernista, que faz
prevalecer a noção de progresso e de telos – em sua
forma mais autentica – onde cada obra é por si só genuinamente nova e supera
(ou pelo menos é capaz de superar) sua predecessora. O retorno da historia em
meio aos prognósticos do desaparecimento do “telos histórico” é explicado por
Eagleton como uma segunda característica bem marcante do pós-modernismo.
“O modo pelo qual qualquer observação virtual sobre
o presente pode ser utilizada como sintoma e índice da logica mais profunda do pós-modernismo,
que assim se torna, imperceptivelmente, sua própria teoria e a teoria de sí
mesma.”
P.16
Fala
isso no intuito de provar que este tempo é um tempo singular, completamente
distinto de qualquer outro momento do tempo humano. Tal forma de pensamento,
segundo o autor, acaba por fazer abrigar uma patologia auto referencial, “como se nosso completo esquecimento do
passado se exaurisse na contemplação vazia, mas hipnótica, de um presente esquizofrênico
e incomparável por definição”.
No entanto, o pós-modernismo tenta quebrar o paradigma
do progresso, e volta seu olhar para a ruptura, a descontinuidade; segundo
autor, a impossibilidade de emergência de uma nova cultura se deve ao fato do pós-modernismo ser a ruptura,
desconstrução e ressignificação de tudo aquilo que já foi. Dessa maneira,
algumas características muito marcantes no modernismo se fazem a mostra também no
pós-modernismo, e justamente por isso Terry Eagleton fala que
“Da mesma forma
que se dizer ‘pos-modernista’ não significa unicamente que você abandonou de
vez o modernismo, mas que percorreu à exaustão ate atingir uma posição ainda
completamente marcada por ele”. – o pre-pós-modernismo.
Nesse processo de reflexão sobre o tema,
acabei por fazer uma metáfora para explicar o que consegui entender sobre a pós-modernidade.
Nesse sentido, fiz uma analogia entre o pós-modernismo/pos-modernidade e um
vulcão, ao qual denominei de “vulcão pós-moderno”. Para explicar, preparei um
diagrama que ajudará muito.
Jameson encara a cultura pos-modernista
como um reflexo da modificação sistêmica do próprio capitalismo. Ela é impura,
como ele mesmo diz, justamente por ser a mistura de tudo aquilo que já existiu
em outro estado físico.
“O pós-modernismo
não é a dominante cultural de uma ordem social totalmente nova (sob o nome de
sociedade pós-industrial, esse boato alimentou a mídia por algum tempo) mas é
apensa reflexo e aspecto concomitante de mais uma modificação sistêmica do próprio
capitalismo”.
Entretanto,
a definição do pós-modernismo (pelo menos na arte) como uma ruptura ou uma
continuidade – ou como o próprio autor diz: “se o presente deve ser visto como historicamente original ou como uma repetição
do mesmo em uma nova embalagem” – não é algo que se pode justificar em
termos empíricos ou filosóficos. Por isso não podemos classificar nosso
presente como historicamente original; porque a lava que constituída sob nova forma
física fora do vulcão é a mesma que se encontrava, ate então, no interior do
mesmo. Para tal, Jameson usa a terminologia genealogia
múltipla.
“Em retrospectiva, o novo nome (pós-modernismo) nos
abriu a possibilidade de pensar o que foi que sentimos e isso porque agora
temos um nome para dar aos nossos sentimentos e esse nome é validado pelo uso
que outas pessoas fazem dele.”
Apesar dos dois autores trabalhados
fazerem uma analise do pós-modernismo baseado nesta mudança do capitalismo, a especulação
de Jameson aproxima, mas de forma contraria, às ideias de Terry Eagleton, que
entrelaça tal forma de pensamento à psicanalise, a qual considera, assim como o
próprio pós-modernismo, de estruturalista e um subproduto dele mesmo dentro
dessa logica capitalista; diferente de Jameson que enxerga nisso tudo uma ressignificação.
A ressonância cultural do pós-modernismo continua na função dialética, visto
que por um lado desvia a atenção da economia e, por outro, permite que fatores econômicos
e inovações mais recentes (em marketing, cinema e arte – apontado aqui a titulo
de exemplo) sejam recatalogados. Seria como reescrever todas as coisas
familiares em novos termos e assim propor modificações; um reembaralhamento de
valores.
O esquema do vulcão, a meu ver,
pode-se ser considerado uma junção dos argumentos teóricos desses dois autores
trabalhados. Dentro daquela classificação do pós-modernismo como um ser hibrido,
introduzido por Eagleton, podemos fazer analogia à lava do ‘vulcão pós-moderno’
que na sua fase de matéria sólida, é incapaz de se ‘reproduzir’, de sua matéria
se tornar algo para além daquilo ou, quem sabe, mudar novamente de estado físico.
Ainda assim, é importante lembrar que este ‘vulcão’ pode entrar novamente em erupção
e a próxima ‘lava’ que emergir, irá consequentemente se materializar sobre a
forma física em cima daquela que já existe. Transformará aquele espaço, mas não
destruirá o já existente; modificara mais uma o cenário pré-existente. Diria que essa pintura se encaixaria no quadro
que Terry Eagleton chama de pré-pós-modernismo.
As principais marcas do modernismo se fará presente no interior/na parte de
baixo da ‘lava’ que acaba de emergir. Ela não será destruída ou apagada pela ‘nova’;
está apenas enquadrando-se na camada mais velha, fazendo parte do cenário passado,
mas existindo ainda.
[i] Apenas
lembrando que Eagleton faz uma analise socialista do pós-modernismo. Então,
toda sua pauta de critica gira aos redores dos aspectos políticos e teóricos.